NA ONDA DA POLÍTICA
As rádios comunitárias, muitas clandestinas, lutam para não ser fechadas nem apropriadas por políticos ou religiosos
Por Phydia de Athayde
Duas da tarde em Heliópolis, a maior favela da cidade de São Paulo. A rua principal está cheia, bem como suas vielas. Na quadra da associação de moradores, jovens ouvem rap e jogam bola. Rosemeire Alves de Lima, de 36 anos, aflita, procura por Gerô na sede da Rádio Heliópolis. Precisa anunciar o sumiço do filho. Não consegue: a rádio está fora do ar. Para Rosemeire, desempregada, que não tem acesso internet nem sabe o que é YouTube ou podcast, direito comunicação é poder anunciar o filho perdido na rádio da favela.
Telona. Cena de Uma Onda no Ar, inspirado na Rádio Favela, de Belo Horizonte |
Dia 20 de julho, agentes da Polícia Federal e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fecharam a rádio que funcionava há 14 anos sem outorga do Ministério das Comunicações, portanto, clandestinamente.
Gerô é Geronino Barbosa de Souza, de 36 anos, coordenador da emissora e um dos responsáveis pela consolidação da Rádio Heliópolis como instrumento de articulação da favela. A Heliópolis é um expoente do conceito de rádio comunitária: toca todo tipo de música e informa a população sobre direitos e deveres, faz campanhas de conscientização em saúde, educação e cidadania. Também anuncia documentos encontrados e mantém o serviço de localização de gente perdida, como o filho de Rosemeire.
O processo completo para a liberação de uma rádio comunitária tem levado até oito anos. Como se pode prever, elas não esperam tanto tempo e começam a funcionar, clandestinamente. À Anatel cabe fechar e lacrar, indiscriminadamente, qualquer emissora sem outorga, como a Rádio Heliópolis, ou como uma rádio que funcionava dentro da USP e foi fechada na quarta-feira 2, e também milhares de outras Brasil afora. Este ano, a Anatel fechou cerca de 800 emissoras.
E então?
Burocracia mata até rádio comunitária… mas a quem interessa que elas funcionem e cumpram seu papel de informar?
Por certo que classe política não.