Lula e os aposentados

@ Veja.com.br

@ Stephen Kanitz

“Os ganhos de produtividade dos que continuam trabalhando não podem ser redistribuídos aos que se aposentaram”

Lula mostrou coragem e responsabilidade ao vetar o aumento de 16% aos aposentados, pleiteado pela oposição, especialmente num ano eleitoral. Verdade seja dita. Sessenta e dois por cento dos aposentados foram negativamente afetados – pense nisso quando surgirem acusações de que Lula usa a máquina para se eleger. Nesse caso usou contra. Quem paga o grosso do salário mínimo no Brasil é o Estado, para 62% de seus aposentados. Somente 4% dos empregados das grandes empresas recebem salário mínimo, o que por si só já é um ponto para profunda reflexão.

Ilustração Atômica Studio

O problema dos aposentados é o seguinte: nossa previdência é financiada por um sistema denominado Repartição Social, em que as novas gerações pagam pela aposentadoria da velha geração. Nossa velha geração rejeitou o outro sistema de previdência chamado de Acumulação Atuarial, em que cada geração acumula o capital necessário para sua própria aposentadoria, para não ser um peso financeiro para as futuras gerações. Por isso, deixamos de acumular 7 trilhões de reais, que hoje financiariam nossa aposentadoria, nosso crescimento, reduziriam os juros, gerariam empregos, diminuiriam a violência etc. Dívida essa que a nova geração, educada para ser altruísta e solidária, vai pagar.

No Sistema de Repartição Social, todo aumento no salário mínimo aumenta o déficit do governo, a dívida interna e os juros. Apesar do veto de Lula, essa briga entre aposentados e o governo não terminou, e continuará por mais trinta anos, anotem. Quem já é aposentado quer receber seu “direito adquirido”, porque não foi estimulado pela nossa elite intelectual a poupar na juventude. Sabe também que, a esta altura do campeonato, não poderá mudar para o sistema de Acumulação Atuarial.

Por outro lado, os trabalhadores na ativa não querem ganhar o mesmo salário para sempre. Querem pelo menos a incorporação dos ganhos anuais de produtividade, das melhorias que eles próprios muitas vezes idealizaram no processo de produção. Uma saída salomônica seria essa que Lula, Dilma Roussef e Tarso Genro tentaram costurar com outro raciocínio e não com este que vou expor aqui. Todo aposentado teria direito ao salário mínimo da data de sua aposentadoria, corrigido pela inflação. Isso é pacífico, não se discute. São os 5% de aumento que o governo ofereceu aos aposentados. Mas os trabalhadores que continuarem na ativa terão direito aos aumentos de inflação e de produtividade futuros. Os já aposentados não, razão do veto dos 16%.

Não vejo como eu, que já sou aposentado, poderia argumentar convincentemente o meu direito adquirido de receber os acréscimos de produtividade obtidos pelos meus colegas da FEA-USP que continuam trabalhando.

A produtividade conquistada depois da minha aposentadoria não é minha, mas daqueles que continuaram a trabalhar, a pesquisar e a inovar. Não entendo funcionários da ativa que defendem a paridade salarial com os aposentados, porque isso contribui para reduzir os salários justamente de quem está na ativa. Eles não percebem que dividirão seus ganhos de produtividade futuros com os já aposentados do passado, como eu. Razão do arrocho salarial que o funcionalismo público vem sofrendo há tantos anos e nas empresas com planos de aposentadoria sem provisão atuarial. Certifique-se disso antes de aceitar seu próximo emprego.

Com todo o respeito por quem já se aposentou, justiça precisa ser feita para aqueles que continuam na ativa. Os ganhos de produtividade dos que seguem trabalhando não podem ser redistribuídos aos que se aposentaram.

Trabalhador que se aposentar em 2007, por exemplo, receberá seu salário mínimo do ano de sua aposentadoria, corrigido pela inflação, ano após ano. Mas não receberá o salário mínimo de 2008, o de 2009, o de 2010, que deverão, eventualmente, contemplar o aumento de produtividade de 2008, 2009 e 2010 daqueles que continuaram na ativa.

Assim, poderíamos aumentar todo ano o salário mínimo dos que trabalham, sem aumentar o déficit da Previdência. Aumentaríamos o estímulo à produtividade daqueles que continuam trabalhando, especialmente do governo. Afinal, produtividade não tem sido o forte dos nossos governos. Quem quiser esses aumentos de produtividade que não se aposente tão cedo, reduzindo ainda mais nosso déficit com a futura geração.

A Veja e o Kanitz que me perdoem, mas eu tinha de postar o artigo na íntegra.
Excelente!
Não vejo nenhuma forma mais apropriada de resolvermos este nosso câncer.
E você?

Capivarou!, Sociedade

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